Este informativo do Lembi Advogados tem como objetivo apresentar as principais atualizações de outubro de 2024, incluindo legislações, decisões e discussões relevantes no campo de Wealth Planning. Estamos à disposição para quaisquer esclarecimentos sobre os temas abordados abaixo.

Reforma Tributária

Projeto de Lei Complementar (“PLP”) 108/2024 foi aprovado pela Câmara dos Deputados e segue para o Senado Federal.

Em 30 de outubro de 2024, o Plenário da Câmara dos Deputados concluiu a votação dos destaques do PLP 108/2024, que institui o Comitê Gestor do Imposto sobre Bens e Serviços (“CG-IBS”), dispõe sobre o processo administrativo tributário relativo ao lançamento de ofício do Imposto sobre Bens e Serviços (“IBS”), sobre a distribuição para os entes federativos do produto da arrecadação do IBS, e sobre o Imposto sobre Transmissão Causa mortis e Doação de Quaisquer Bens ou Direitos (“ITCMD”).

Entre os principais pontos discutidos, destacamos os seguintes:

  • ITCMD: a rejeição da cobrança do ITCMD sobre os planos de previdência Vida Gerador de Benefício Livre (“VGBL”), deixados como herança. Foi rejeitada, também, a cobrança do imposto sobre a chamada distribuição desproporcional de dividendos, que ocorre quando uma empresa distribui recursos de maneira desigual entre os sócios. Previu o recálculo da alíquota do ITCMD em um segundo momento de transmissão de bens por causa mortis se valores de aplicações financeiras tiverem sido transmitidos aos herdeiros em momento anterior, somando o valor total de bens transmitidos para fins de aplicação da progressividade de alíquota;
  • Imposto sobre Grandes Fortunas (“IGF”): também foi rejeitada a emenda para criar o IGF, por 262 votos a 136. A proposta era taxar em 0,5% ao ano os patrimônios de R$ 10 milhões a R$ 40 milhões, em 1% aqueles entre R$ 40 milhões e R$ 80 milhões e em 1,5% as riquezas maiores do que R$ 80 milhões;
  • Exclusão de multa: a emenda prevê a exclusão de multas e a não representação fiscal para fins penais contra o contribuinte se o processo administrativo tiver sido resolvido a favor do Fisco por voto de desempate do presidente da câmara de julgamento;
  • Transferência de saldo credor de Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (“ICMS”): foi incluída a permissão para a transferência de créditos do saldo credor do ICMS para terceiros de mesmo grupo econômico.

Supremo Tribunal Federal (“STF”)

Imposto de Renda Retido na Fonte (“IRRF”) de 25% sobre aposentadorias e pensões pagas a brasileiros residentes no exterior é inconstitucional.

No dia 18 de outubro, no julgamento do Recurso Extraordinário com Agravo (“ARE”) 1.327.491, com repercussão geral (Tema 1.174), o Plenário do STF decidiu que é inconstitucional a incidência da alíquota de 25% do IRRF sobre pensões e aposentadorias recebidas por brasileiros que residem no exterior.

O caso em julgamento no STF envolve uma aposentada que recebe uma pensão equivalente a um salário-mínimo e reside em Portugal. A contribuinte argumenta que, devido à sua condição de residente no exterior, está sendo sujeita à alíquota de 25%, estabelecida na Lei 9.779/1999, do IRRF sobre sua aposentadoria diferente do que ocorre com os residentes, que estão sujeitos às alíquotas progressivas de 0% a 27,5%. No entanto, entende que essa cobrança é inconstitucional, pois viola os princípios constitucionais da isonomia, da progressividade do Imposto de Renda (“IR”), da garantia do não confisco e da proporcionalidade.

A União sustentou que a diferença de tratamento não se dá em razão de função profissional, classe ou valor econômico, mas de questão territorial, uma vez que a Fazenda Nacional não tem poderes em território estrangeiro. Segundo seu argumento, a alíquota de 25% está fundada no fato de que a tributação é feita exclusivamente na fonte, pois o contribuinte não tem de apresentar declaração de ajuste anual no Brasil.

O relator do caso, Dias Toffoli, argumentou que essa tributação fere princípios como isonomia, progressividade fiscal, vedação do confisco e proporcionalidade, já que a carga tributária sobre esses cidadãos é desproporcional em relação àquela aplicada aos residentes no Brasil.

Desta forma, o STF firmou a seguinte tese: “É inconstitucional a sujeição, na forma do art. 7º da Lei nº 9.779/99, com a redação conferida pela Lei nº 13.315/16, dos rendimentos de aposentadoria e de pensão pagos, creditados, entregues, empregados ou remetidos a residentes ou domiciliados no exterior à incidência do imposto de renda na fonte à alíquota de 25% (vinte e cinco por cento)”.

Não incide Imposto de Renda Pessoa Física (“IRPF”) sobre doação que adianta a herança.

A primeira turma do STF no julgamento do Recurso Extraordinário (“RE”) 1.439.539, por unanimidade, afastou a possibilidade de cobrança do IRPF sobre o Ganho de Capital na antecipação de herança, alegando que a incidência do imposto federal acarretaria dupla tributação, por já incidir o Imposto sobre a Transmissão Causa Mortis e Doação (“ITCMD”), de competência estadual.

A União argumentava que: “para fins tributários, a doação importa alienação, e está sujeita à apuração do ganho de capital, quando o bem doado for transferido por valor superior ao declarado pelo doador, situação em que haverá a incidência do imposto, consideradas as reduções permitidas”.

Por sua vez, o contribuinte alegava que: “haveria uma inconstitucionalidade/ilegalidade formal e material da expressão “doação”, constante no §3º do art. 3º da Lei nº 7.713, de 1988, da locução “doação em adiantamento de legítima” inserta no caput do art. 23 da Lei nº 9.532, de 1997, e do inteiro teor do inciso II do § 2º do art. 23 da Lei nº 9.532, de 1997”.

Durante o julgamento, o STF estabeleceu o entendimento de que “não há materialidade tributária nesse acréscimo patrimonial em favor do doador”, conforme destacou o Ministro Luiz Fux. Embora tenha acompanhado a posição do Ministro Flávio Dino, Fux ressaltou que os fatos geradores do IR e do ITCMD são distintos, pois o primeiro se refere ao acréscimo de patrimônio, enquanto o segundo trata da transferência em caso de falecimento.

Assim, com o Acórdão proferido, a sentença foi reformada para conceder a segurança pleiteada em sede de mandado de segurança para reconhecer a inconstitucionalidade formal e material da expressão “doação”, constante no § 3º do art. 3º da Lei nº 7.713, de 1988, da locução “doação em adiantamento de legítima” inserta no caput do art. 23 da Lei nº 9.532, de 1997, e do inteiro teor do inciso II do § 2º do art. 23 da Lei nº 9.532, de 1997, bem como para determinar que a Autoridade Coatora se abstivesse de exigir imposto de renda em face do Impetrante sobre doações de bens e direitos para seus filhos, transmitidos a valor de mercado.

O julgamento não ocorreu sob a sistemática de repercussão geral, que vincula todos os órgãos do Poder Judiciário, mas ainda assim estabelece um importante precedente sobre a matéria. Contudo, espera-se que o tema seja levado ao plenário, devido à divergência entre as turmas do STF sobre o assunto.

Legislação

Decreto nº 12.226/2024 – Critérios para afastamento da qualificação de país ou dependência com tributação favorecida ou regime fiscal privilegiado.

Em 18 de outubro de 2024, foi publicado o Decreto nº 12.226/2024, que regulamenta os critérios de país ou dependência com tributação favorecida ou de regime fiscal privilegiado para afastar da qualificação países que fomentem, de forma relevante, o desenvolvimento nacional por meio de investimentos significativos no País.

De acordo com a previsão do artigo 24 e 24-A da Lei nº 9.430/1996, a definição legal de país ou dependência com tributação favorecida ou de regime fiscal privilegiado, abrange países que não tributam a renda à alíquota mínima de 17%.  Além do critério referente à alíquota mínima, a qualificação de país ou dependência com tributação favorecida ou de regime fiscal privilegiado pode decorrer ainda do não acesso a informações societárias e beneficiários efetivos; e, para regime fiscal privilegiado, da concessão de vantagens fiscais sem atividade econômica local substantiva, ou não tributação de rendimentos auferidos fora do seu território.

O Decreto nº 12.226/2024 regulamenta o artigo 24-C da Lei nº 9.430/1996, com redação da recente Medida Provisória (“MP”) nº 1.262/2024, que autoriza o afastamento das qualificações de país ou dependência com tributação favorecida ou de regime fiscal privilegiado, exclusivamente decorrentes do não cumprimento da alíquota mínima de 17% sobre a renda. Essa requalificação é permitida aos países que fomentem, de forma relevante, o desenvolvimento nacional, por meio de investimentos significativos no Brasil e foi introduzida como forma de promover o investimento estrangeiro no País, conforme exposição de motivos da MP. 

Nesse sentido, o Decreto nº 12.226/2024 prevê que são considerados investimentos significativos, que podem levar à exclusão das qualificações de país ou dependência com tributação favorecida ou de regime fiscal privilegiado: (i) os investimentos em título direto emitido pelo Governo brasileiro; e (ii) os investimentos diretos no capital de empresas brasileiras ou em fundos de investimentos brasileiros, por país do controlador final do investimento direto, com prioridade para aumento de capital fixo e atividades alinhadas a práticas sustentáveis.

Os investimentos em questão são aqueles realizados pelo Governo estrangeiro, seus fundos soberanos ou empresas públicas com controle majoritário estatal, pelo prazo mínimo de cinco anos, e em patamares compatíveis com cada país investidor, admitindo-se distinção entre as fases de implantação e operação. 

Portanto, é possível pedir o afastamento da qualificação como país ou dependência com tributação favorecida ou de regime fiscal privilegiado de determinado país ou dependência, desde que ela decorra exclusivamente do critério de tributação da renda pela alíquota mínima de 17%, e que haja investimentos significativos no Brasil na forma exigida pelo Decreto nº 12.226/2024.